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A antropóloga norte-americana Margaret Mead, falecida em 1978, talvez não tenha ouvido falar de ressonância mórfica que o biólogo inglês Rupert Sheldrake lançou em 1981 em seu livro A New Science Life. Seu feeling, porém, sempre a fez acreditar na construção coletiva do saber e no seu poder de transformação. Também conhecida como o fenômeno do centésimo macaco, a proposta de Sheldrake partiu da observação de macacos por cientistas japoneses. Na década de 1950, numa ilha do Japão, eles jogaram batatas-doces cruas na praia. Os macacos gostaram do sabor, mas não da areia que as envolvia. Mas uma das fêmeas jovens descobriu que lavar as batatas no rio resolvia o problema e ensinou à mãe. E assim, sucessivamente, a novidade foi se espalhando entre os macacos jovens, que transmitiam às suas mães. Mas só os adultos que imitaram os filhos aprenderam esse avanço social. Até que, numa bela manhã, quando 99 macacos já lavavam suas batatas, o inesperado aconteceu: o centésimo macaco lavou a batata e todo o bando passou a fazer o mesmo. Mas o mais surpreendente estava por vir: o hábito chegou a outras ilhas cujos macacos passaram a lavar as batatas-doces sem que houvesse comunicação convencional entre as duas populações: o conhecimento simplesmente se incorporou aos hábitos da espécie.

Segundo Sheldrake, quando certo número de macacos atinge um nível de consciência, esta pode ser comunicada de uma mente a outra. A essa descoberta ele chamou de ressonância mórfica. O biólogo explica que, ao contrário dos campos físicos, os campos mórficos não envolvem transmissão de energia. O que se transmite através deles é pura informação. Quando só um número limitado de pessoas conhece um caminho novo, ele permanece como patrimônio da consciência dessas pessoas. Mas há um ponto em que, se mais uma pessoa se sintoniza com a nova percepção, o campo se alarga de modo que essa percepção é captada por quase todos. Assim, o conhecimento adquirido por um conjunto de indivíduos agrega-se ao patrimônio coletivo, provocando um acréscimo de consciência que passa a ser compartilhado por toda a espécie. Enfatizam-se, assim, as dimensões coletivas e transpessoais. Parece telepatia. Mas Sheldrake explica que não é, porque, tal como a conhecemos, a telepatia é uma atividade mental superior, focalizada e intencional que relaciona dois ou mais indivíduos da espécie humana. A ressonância mórfica, ao contrário, é um processo básico, difuso e não intencional que articula coletividades de qualquer tipo: átomos, moléculas, cristais, organelas, células, tecidos, órgãos, organismos, sociedades, ecossistemas, sistemas planetários, sistemas solares, galáxias…

A história do centésimo macaco aponta para uma verdade: o interesse por nós mesmos e pelos outros cria um campo de energia de tal intensidade que é capaz de acabar com os velhos mitos e propor caminhos novos. Assim, quando certo número crítico de consciências absorve e adota uma nova ideia, concepção, propósito teórico ou prático, essa nova consciência passa a ser transmitida de mente para mente, materializando-se na prática, transcendendo quaisquer tipos de barreiras e tornando-se real. Há um ponto em que se mais uma pessoa sintoniza e absorve esse conhecimento, essa crença, o campo se amplia de modo que o novo saber é captado por todos, fazendo acontecer o sonho, a inovação, a nova perspectiva até então impedida por razões energéticas próprias do universo, de se concretizar. Quando aplicamos à nossa realidade a hipótese de Sheldrake, entendemos como as mudanças fundamentais nos seres humanos podem ocorrer. No princípio, mudança de atitude ou comportamento é difícil, mas conforme vai crescendo o número de pessoas que mudam, torna-se progressivamente mais fácil para outras pessoas fazerem o mesmo.

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Em determinado ponto, alcança-se o número certo de indivíduos, a gota d’água, o hipotético e anônimo centésimo macaco que virou o jogo: aquela mudança de comportamento mostra o momento crítico em que os indivíduos modificam sua conduta e há a inversão no equilíbrio de forças. Divorciados da realidade, como se vivessem numa torre de marfim cercados de todas as benesses e prerrogativas a que julgam ter direito, nossos políticos não estão se dando conta de que o centésimo macaco deve, não sem tempo, ser a gota d’água na paciência da população para uma mudança radical na sociedade brasileira.

Em todos os movimentos populares, que, no Brasil, eclodiram com força em 2013, tudo começou sem organização central, sem um líder específico, como um impulso de parte da sociedade coordenando-se através de redes sociais na internet, movimentando uma multidão às ruas em uma manifestação contra algum problema concreto: aumento na passagem de ônibus no Brasil, alterações urbanísticas na Turquia, crimes financeiros nos EUA, décadas de autoritarismo no Egito. É como se o motivo do protesto fosse uma gota d’água. Mas o curioso é que tantas gotas d’água caíam ao mesmo tempo em lugares tão distantes ao redor do mundo, causando transbordamentos simultâneos de indignação. Em todas essas manifestações, há um sinal de que a consciência coletiva está pressionando multidões ao redor do planeta a implementar transformações importantes, concretas e efetivas. Essas manifestações têm outra coisa em comum: são inspiradas na crença de que todos nós, unidos sem lideranças oportunistas e sem qualquer uniformização de nossos sonhos pessoais, podemos fazer transformações importantes. Na nova realidade, a inteligência coletiva mostrará que não é mais simples espectadora e sim protagonista, capaz de colaborar para a construção de um país melhor de ser vivido.

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